terça-feira, 5 de abril de 2011

O Flamingo…




Ele era o David e ela era a Maria. Dois seres humanos cuja vida tornou em apenas um.

David era brincalhão, simpático e paciente, já Maria era teimosa, preocupada e bastante organizada. Tudo começou num despropositado encontro num banco de jardim. Desde ai, começaram a aproximarem-se, a conhecerem-se e algum tempo depois chegaram a casar. A vida sorria-lhes! Tinham ambos bons empregos, uma boa casa e muito amigos com quem partilhavam as tristezas e as muitas alegrias da sua vida. Porém, faltava alguma coisa. Por mais posses, por mais dinheiro ou por mais amigos que tivessem, havia um espaço vazio por ocupar. E , pouco tempo depois, esse espaço foi preenchido. Maria deu a luz uma linda menina à qual deu o nome de Julieta. Finalmente as suas vidas ficaram completamente preenchidas.

Julieta era a mais doce bebé que poderia haver. E quase sem darem por isso, foi crescendo. E depois de aprender a andar e a falar, David e Maria começaram a contar-lhe história de fadas, dragões, príncipes e princesas. Mas no meio de tantas histórias fantásticas, havia uma que a fascinava particularmente. Estava escrita num pequeno livro cor-de-rosa claro. Falava de um flamingo que trocou os lagos de água morna pelas serras cobertas de neve. E a história é toda a volta da adaptação do flamingo à neve e do seu grande amor, que lá encontrara. Julieta nunca se cansava de ouvir aquela história. Ela fazia desenhos do tal flamingo, inventava outras versões e até fazia esculturas em plasticina e barro.

A vida foi então passando, e quando a pequena Julieta tinha cerca de oito anos, um acidente pôs termo à vida dos seus pais. Maria estava a cozinhar e David estava a por a mesa enquanto esperavam pela chegada da Julieta que estava numa festa de anos. Sem reparar, Maria deixou um pano de cozinha junto do fogão, e aquele simples acto gerou um incêndio. O sucedido foi noticia de primeira página em todos os jornais de toda a parte durante largos meses. E para Julieta o fim do mundo tinha chegado. Julieta não sabia o que seria a sua vida dali para a frente. Apenas sabia que ia viver com a sua avó Lurdes. Não era mau de todo, a sua avó até era simpática. Mas claro, não era a mesma coisa. Já não ia adormecer da mesma maneira. E pior que tudo, já não ia ouvir a história do flamingo da mesma maneira.

Uma parte da casa de Julieta não tinha ardido, portanto Julieta ainda conseguiu recuperar alguns pertences, como roupas, jóias, peças de decoração. Horas depois de se ter instalado na casa da avó Lurdes, Julieta reparou que lhe faltava uma coisa. Curiosa e inexplicavelmente tinha-se esquecido do pequeno livro rosa que continha a história do Flamingo da neve. Voltou a casa e vasculhou todas as gavetas, todas as caixas e todos os armários que resistiram ao incêndio até encontrar o tão querido livro. Mas nada! O livro não estava em parte alguma. Como é que é possível! No meio de tanta procura, apenas encontrou um dos muitos desenhos do Flamingo. Aquele pedaço de papel era a única coisa que tinha de recordação dos pais e da tão fantástica história. Julieta, enquanto olhava para aquele desenho, lembrava-se perfeitamente das noites em que não conseguia dormir, e a mãe lhe lia a história. Lembrava-se perfeitamente da primeira vez que o pai a levou ao jardim zoológico para ver os flamingos. Lembrava-se perfeitamente dos pais a ensinar-lhe a desenhar e a ajudarem-na a fazer aquele mesmo desenho. E aquele pedaço de papel velho, um pouco amaçado acompanhou Julieta no resto da sua vida!


Susana Lage, nº24, 7ºC